terça-feira, março 01, 2022

O Beco do Pesadelo

(Nightmare Alley, EUA, 2021)
Direção: Guillermo del Toro
Elenco: Bradley Cooper, Rooney Mara, Cate Blachett, Toni Collette

Guillermo del Toro é um mestre da fantasia. Seu cinema mágico é extremamente imaginativo e amplo, e usa ao seu favor a exploração de vários temas e gêneros - algo muito evidente nos seus últimos filmes. Ele brinca com o gótico no regular A Colina Escarlate (2015); faz uma linda e açucarada homenagem ao cinema sci-fi dos anos 1950 no premiadíssimo A Forma da Água (2017); e agora nos deleita com o universo do film noir na refilmagem do clássico O Beco das Almas Perdidas (1947) de Edmund Goulding.
No início da Segunda Guerra Mundial, Stanton Carlisle incendeia uma casa no meio do nada com um cadáver dentro, e andando sem rumo se depara em um circo de horrores típico da época. Lá, testemunha as coisas boas como a paixão platônica pela Molly, uma garota a prova de choque elétrico, e a amizade com Pete, um vigarista  que lhe ensina a arte de enganar as pessoas com a telepatia. Mas fica abismado com o dono do circo em explorar um homem miserável a ponto de torturá-lo para exercer o papel de um monstro selvagem. Após um tempo com a trupe, Stanton decide dar uma nova guinada em sua vida, e  junto com a Molly vão para Nova Iorque. Na cidade maça, a dupla ganha muito dinheiro com os shows de telepatia. No entanto, a atração da dupla chama a atenção da psiquiatra Lilith que vê na habilidade de Stanton a pessoa ideal para aplicar golpes em homens ricos...e perigosos.
Aqui o diretor divide a narrativa em duas linhas. A primeira formada no circo em que o diretor bebe na fonte do clássico Monstros (1932) de Todd Browning, e chama atenção pelos personagens "excêntricos". Aqui o filme abraça um tom mais misterioso mas que não resvala para algo mortal. Na segunda parte, o filme cai de cabeça no cinema noir com direito a femme fatale e personagens ambíguos. O estado de perigo, tensão e mistério é constante.
O filme aborda a maldade e os seus ciclos que vai afundando o protagonista até chegar a um ponto que parece não ter mais volta. Como diria Stanton para a Dr. Lilith: "eu sei que você não presta porque eu também não presto. Combinamos". E falando nos dois personagens, Bradley Cooper e Cate Blachett são os destaques mesmo que eu tenha adorado a primeira parte em que Willem Dafoe rouba a cena como sempre.
E não dá para falar de algum filme do diretor sem comentar a produção. Tudo aqui é caprichado. A fotografia sombria de Dan Laustsen que brinca com o escuro mas destaca o dourado (a ambição do protagonista). O lindo design de produção de Tamara Deverell e Shane Vieau que explora tão bem a magia e a decadência do circo e a frieza mortal da cidade de Nova Iorque. A trilha sonora de Nathan Johnson é tímida mas envolvente que se destaca em momentos precisos.
O Beco do Pesadelo é uma boa fábula sobre a degradação moral; em que o personagem Stanton até recebe de presente uma segunda chance para a redenção mas a sua natureza fala mais alto, e del Toro nos brinda com um universo que só ele é capaz de imprimir o que fascina até o soturno protagonista. Não é o melhor filme da carreira do diretor, Labirinto do Fauno ainda é a sua obra-prima, um deleite aos olhos ao mesclar encanto e uma dolorosa parte da história da Espanha. Mas em O Beco do Pesadelo permite o diretor se conectar mais ao seu clássico de 2006 ao expor uma visão mais realista e pessoal da natureza humana. Espero que o diretor não desvie da rota e continue caminhando na trilha da alma humana - sem perder a sua essência e principalmente a imaginação.

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