quinta-feira, agosto 05, 2021

Tony Manero

(Chile, 2008)
Direção: Pablo Larraín
Elenco: Alfredo Castro, Amparo Noguera, Hector Morales, Paola Lattus.

Em uma sessão de cinema, Raul Peralta se emociona na cena do filme Os Embalos de Sábado à Noite em que Tony Manero interpretado por John Travolta se revolta pelos seus pais quererem controlar o seu destino. Essa cena aparentemente banal resume bem a natureza do filme (escapismo e autoritarismo) do sempre ótimo Pablo Larraín. E aqui ele bebe da fonte do Lars von Trier captando o pior da natureza humana.
Na Santiago do Chile de 1978 sob a mão de ferro da ditadura de Pinochet entrou na onda a febre das discotecas graças ao sucesso midiático do filme de John Badham. E essa moda pega em cheio o protagonista, um homem já na casa dos 50 anos que de tanto assistir o filme se autodenomina Tony Manero. Participa de programas de televisão, dança em uma casa de show clandestina e miserável. Mas aqui tem um homem que esconde uma psicopatia que aparece em momentos inesperados (matar uma senhora para roubar um televisor; assassinar os funcionários de um cinema por causa da saída de cartaz do seu amado filme).
Com uma atuação arrebatadora de Alfredo Castro, o ator chileno dá vida a um sujeito calado, frio, observador mas com um olhar distante que se transmuta em maldade por segundos. E o desequilíbrio de Raul é calculadamente exposto pelo Larrain e o fotografo Sergio Armstrong. Através de uma paleta escura e crua calcada no realismo, a dupla também enfatiza o lado psicológico do personagem. Nas cenas realizadas nas ruas de Santiago, Raul e a câmera sempre estão em movimento - correndo, tenso, nervoso, acuado. Já nos ambientes internos, a câmera na mão sempre se mostra próxima do protagonista; quando se distancia a imagem fica borrada, desfocada. Outro acerto da produção foi a ausência de trilha sonora o que torna a obra seca e sem sentimentos.
Tony Manero retrata a loucura autoritária institucional que impulsiona a maldade dos civis (não é mera coincidência que vejo essa realidade no Brasil de 2021). Larrain faz um tenso e perturbador estudo de personagem de um homem envolvido pelo mal que perdeu a noção da realidade e identidade, e ao mesmo tempo demonstra a arte como elemento alienante, uma fuga de uma realidade opressora e violenta.

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